Um dos tópicos mais significativos em discussão na indústria gráfica é a recente demanda por processos ecologicamente sustentáveis. Atualmente as gráficas não podem mais se dar ao luxo de ignorar esse assunto. Não é apenas a preservação do meio ambiente que está em jogo. A rentabilidade futura das empresas do setor está diretamente ligada à forma como as questões de produção sustentável forem abordadas hoje. A pergunta é: o que devemos fazer para tornar a impressão um processo ecologicamente sustentável?
O que é sustentabilidade?
O termo sustentabilidade tornou-se um conceito que engloba metas de diferentes áreas envolvendo um amplo espectro de questões científicas, sociais e políticas, como, por exemplo, reduzir a poluição, atenuar as alterações climáticas, proteger as espécies ameaçadas de extinção, amenizar os efeitos da globalização e ser responsável socialmente, entre outras. Os defensores das políticas “verdes” compartilham diversas ideias a respeito de ecologia, preservação e meio ambiente. Com interesses conflitantes, o conceito de sustentabilidade se torna confuso e, às vezes, disputado.
Ser sustentável implica ser capaz de operar de acordo com as necessidades presentes, ao mesmo tempo em que se atende às necessidades das gerações futuras. Em suma, a produção sustentável define uma abordagem do processo de produção mais responsável social e ambientalmente, voltada para o uso consciente dos recursos envolvidos. É muito comum acreditar que para uma gráfica ser “verde” basta imprimir com tintas de base vegetal sobre papel reciclado ou possuir um certificado de cadeia de custódia emitido pelo Forest Stewardship Council (FSC) ou pela Sustainable Forestry Initiative (SFI). Embora essas ações façam parte do caminho para se tornar sustentável, isoladamente elas não tornam uma gráfica sustentável.
A sustentabilidade é um conceito muito mais amplo do que o cuidado com os insumos utilizados. A produção sustentável, para a indústria gráfica, abrange três conceitos principais:
Produto: envolve o design, os insumos utilizados e o destino final dos produtos quando acabados
Processo: envolve o processo de impressão em si, além da pré-impressão e do acabamento
Suporte: envolve todas as atividades de apoio ligadas ao processo gráfico. O suporte inclui o terreno e a estrutura do prédio da empresa, a manutenção, o transporte, os funcionários e outros itens.
Possibilidades de melhoria
Dada a essência dos produtos gráficos, é natural que todos os olhos se voltem para o substrato utilizado e, nesse aspecto, há diversas abordagens. Uma das maneiras mais fáceis de se tornar mais “verde” é utilizar papéis compostos por maiores porções de material reciclado ou papel branco fabricado com processos livres de cloro elementar (ECF). Utilizar papel certificado pelo FSC ou pela SFI (ou outros insumos certificados) evidentemente deixa clara a postura da empresa frente à questão ambiental. No entanto, para colocar o logotipo no produto final, é necessário ter a cadeia de custódia certificada — ou seja, ter uma certificação que garanta a conformidade de todo o processo produtivo.
Também as tintas, vernizes e adesivos são itens nos quais é possível ampliar a sustentabilidade através do uso de óleos vegetais e outros recursos renováveis, materiais com baixa concentração de compostos orgânicos voláteis (VOC). Outra oportunidade é preferir tintas que não sejam feitas com metais pesados e respeitar os limites fixados pela Coalition of Northeastern Governors, que limita o teor de metais pesados como o mercúrio, cromo hexavalente e cádmio a 100 partes por milhão. Já os adesivos precisam ter baixos teores de VOC e devem ser recicláveis.
Além da preocupação com as matérias-primas, os empresários gráficos também devem estar atentos ao processo de fabricação, bem como às instalações e serviços que cercam o produto final.
Da pré-impressão ao acabamento, o processo de produção é repleto de oportunidades para introduzir iniciativas sustentáveis. Muitas gráficas estão começando a utilizar sistemas de provas digitais físicas e virtuais em seus fluxos de trabalho, assim como a tecnologia computer-to-plate, que dispensa o uso de filme e seus subprodutos, os químicos usados na sua revelação. Afora isso, os CtPs podem ser ainda mais ecológicos, utilizando os sistemas de neutralização de pH e filtragem para diminuir a quantidade de químicos consumidos. Já existem, inclusive, sistemas que não usam nenhum produto químico, opção que pode se adequar a diferentes fluxos de trabalho.
A produção em si pode tornar-se significativamente menos agressiva ao meio ambiente com medidas simples como usar tintas diferenciadas, soluções de fonte e solventes de limpeza com baixo ou nenhum teor de VOC e, sempre que possível, incorporar recursos renováveis.
Alguns produtos de limpeza à base de óleo vegetal, com baixos níveis de VOC, podem ser mais difíceis de utilizar, mas há gráficas que têm conseguido fazê-lo. Também é fundamental fazer a manutenção e operação adequada das impressoras, bem como evitar ou, se possível, eliminar o desperdício. Sistemas de filtragem para a solução de fonte se revelaram um recurso eficaz para diminuir radicalmente a quantidade de solução descartada e ainda aumentar a qualidade de impressão.
O cuidado com os solventes de limpeza também traz bons resultados. Hoje existem produtos que não evaporam com facilidade, o que — combinado com a ausência de ingredientes classificados como poluentes aéreos perigosos (HAP) ou compostos tóxicos — não só reduz as emissões de VOC e HAP, como também propicia um ambiente de trabalho mais saudável.
Os produtos químicos alternativos derivados de óleos vegetais para a lavagem de blanquetas exigem alterações no expediente da limpeza. Esses novos produtos deixam resíduos que precisam ser removidos. Se não forem corretamente removidos, podem causar danos à blanqueta e à rolaria.
Para tornar o setor de acabamento mais “verde”, a chave está em mudar os hábitos: reduzir o desperdício, separar o lixo devidamente e repensar a posição de equipamentos e lixeiras, por exemplo. Nesse aspecto, o mais importante é treinar os funcionários adequadamente. Além disso, o cuidado com as matérias-primas também faz diferença: revestimentos e laminados recicláveis, assim como adesivos com baixo teor de VOC, reduzem o impacto ambiental e aumentam o valor do produto.
Ao repensar os processos produtivos é fácil se esquecer dos muitos procedimentos de apoio que envolvem uma atividade gráfica. Nessas áreas-satélites também se encontram boas oportunidades de reduzir a pegada ambiental da empresa. Poupar energia é uma medida de retorno rápido que reduz gastos tanto em curto quanto em longo prazo. É importante observar ainda que o esforço exigido pelas companhias de eletricidade para diminuir a emissão de dióxido de carbono vai elevar o preço da energia para o cliente industrial (no que se refere aos Estados Unidos) em cerca de 20% inicialmente, embora posteriormente esse valor vá cair e se estabilizar na casa dos 5%.
Instituir um programa de gerenciamento do gasto de energia, especialmente durante os períodos de maior demanda, traz benefícios significativos. Alguns dos maiores desperdícios de energia em indústrias ocorrem com o uso de ar comprimido, que pode ser responsável por 3% a 5% dos gastos com eletricidade. Investir em iluminação eficiente, boa ventilação e portas e janelas com bom isolamento também pode reduzir substancialmente o consumo de energia e, é claro, seu custo. Outros aspectos a serem considerados são o destino do lixo gerado pela empresa, o gasto de água e o transporte das mercadorias.
O lucro ao ser “verde”
Certamente, há casos em que as companhias adotam práticas ecológicas simplesmente por preocupação com o planeta. E, quando se percebe que ser “verde” também significa aumento dos lucros, as empresas pioneiras têm vantagens consideráveis sobre as que ficaram para trás por ainda não terem percebido isso. Na prática, adotar ações sustentáveis tem o potencial de reduzir custos. Porém, se isso ainda não é razão suficiente, devemos nos lembrar de que pesquisas demonstram que os consumidores estão mais atentos aos modos e qualidade de produção dos produtos consumidos e grandes empresas já notaram isso. Companhias como Wal-Mart, Coca-Cola, Nike e Ikea têm liderado em uma ampla gama de iniciativas verdes, reduzindo grandes quantidades de resíduos e gases causadores do efeito estufa, entre outros poluentes e toxinas — e estão se beneficiando com isso.
Por onde começar
Ser sustentável não é seguir um pequeno conjunto de regras, mas se comprometer com a melhoria contínua dos processos produtivos, o que exige a compreensão da cadeia operacional como um todo. A fim de capitalizar sobre essa transformação e tirar proveito dela como uma vantagem competitiva, as gráficas precisam ter uma abordagem que seja sistemática e sistêmica.
Uma abordagem sistemática é estruturada sobre um bom plano de ação, que identifica as oportunidades e os recursos que devem ser aplicados para alcançar as metas. Isto se torna mais fácil quando se adota algum tipo de sistema de gestão. Não é necessário possuir uma certificação ISO 14000. No entanto, é preciso que haja organização para o encaminhamento de projetos. Muitas gráficas observaram que, quando adotaram a estratégia de linha de produção lean (ou enxuta), abriu-se uma porta perfeita para as políticas de sustentabilidade ambiental. A combinação dos dois conceitos pode dar resultados poderosos.
A abordagem também deve ser sistêmica, porque todos os funcionários, da recepcionista à equipe de limpeza, devem estar envolvidos no projeto de tornar a empresa sustentável. Ao capacitar os funcionários, as empresas desencadeiam o poder de criativo que reside em cada um.
Para alguns, a perspectiva de alterar os fluxos de trabalho e meios de produção aprovados pela prática pode ser assustadora, mesmo quando os benefícios são óbvios. O melhor caminho é diferente para cada empresa. Em alguns casos pode ser uma transformação radical que vença a inércia dos velhos costumes; em outros, pode ser melhor começar aos poucos, focando projetos específicos que apresentem resultados rápidos.
Primeiro, faça um levantamento do que já está sendo feito. É comum que algumas medidas “verdes” (como separação de lixo para reciclagem e implementação de tecnologia computer-to-plate) já tenham sido aplicadas na empresa, mesmo que esse não fosse o objetivo. Em seguida, deve-se listar quais itens têm maior impacto ambiental. Na maioria dos casos, a ordem será: gasto de papel, consumo de energia, produtos químicos, tintas, solventes e outros emissores de VOC. Repensar as atitudes em relação ao lixo sempre traz benefícios significativos e iniciar um movimento de reciclagem/reuso de papel de escritório pode render recompensas financeiras com pouco investimento.
Para empresas que acabaram de começar o programa o melhor é se concentrar em metas simples e, assim, aumentar as chances de sucesso. Trabalhando em um projeto de cada vez, o sucesso e o impulso irão mover a equipe para o próximo passo e, por fim, a soma de pequenas conquistas resulta em grandes ganhos. A fim de ampliar o poder de ação e o reconhecimento dos funcionários, é essencial que todos conheçam e compreendam os objetivos e, mais importante, percebam os resultados.
Recebendo reconhecimento
A SGP – Sustainable Green Printing Partnership lançou seu programa de certificação em agosto de 2008. Trata-se de uma organização independente que oferece ferramentas de benchmarking aplicáveis à indústria gráfica, verifica práticas de sustentabilidade para empresas baseada numa lista de critérios e reconhece publicamente aquelas que atendem aos critérios estabelecidos. As gráficas certificadas pela SGP estão listadas no site da organização e este é consultado por compradores de produtos gráficos que buscam fornecedores sustentáveis.
Como a sustentabilidade envolve mais do que o produto em si, os critérios de conformidade da SGP são abrangentes e separados por produto, processo e suporte. Para obter a certificação, a gráfica deve atender aos critérios adequados e passar por uma auditoria feita por terceiros (o consultor não pode fazer a auditoria). É necessário que a empresa esteja em conformidade com as regulamentações ambientais e de saúde e segurança; tenha uma política de gestão sustentável; desenvolva e implante um sistema de gestão sustentável (usado para propor um projeto por ano e buscar as melhores práticas de gestão); tenha estabelecida uma metrologia de rastreabilidade adequada; e produza um relatório anual. Há muitos benefícios em se obter uma certificação pela SGP e os ganhos superam amplamente os custos envolvidos. O programa agrega valor ao negócio, gerando redução de custos, aumento da produtividade e reconhecimento pelo empenho em melhorar o ambiente de forma consciente.